Reedição de um golpe


 Por Jeferson Malaguti Soares *


Venho acompanhando com um misto de preocupação e ceticismo alguns artigos na mídia que falam da reedição do golpe de 64, que estaria sendo preparado sorrateiramente. Seria apenas delírio dos articulistas?

Sabemos que a mídia nacional vem se auto designando quarto poder da república de uns tempos para cá, mais exatamente a partir da eleição de Lula em 2002. A força política dessas grandes organizações jornalísticas é significativa. Roberto Marinho, por exemplo, proprietário das Organizações Globo, foi um dos personagens mais poderosos durante a ditadura militar. Ninguém ousava recusar seus convites e pedidos que, na verdade, se tornavam imposições, avalizadas pelo poder reinante na época.

 É também público, notório, de conhecimento  até dos reinos orgânico e inorgânico, que a Globo e a editora Abril ( leia-se revista VEJA) ajudaram a eleger e depois a destronar Fernando Collor, o qual, a posteriori, foi inocentado pelo Supremo Tribunal Federal, independente das provas cabais e materiais, apresentadas pelo Ministério Público contra ele. Pois é esse o mesmo STF que acaba de condenar, sem qualquer prova material ou imaterial, os ex-ministros José Dirceu e Genoíno.
A imprensa montou um quadro de opinião supostamente pública tão desfavorável aos réus do dito “mensalão”, que influenciou até os juízes da mais alta corte do país. Tem sido substituida a opinião sustentada em fatos por aquela apenas adjetivada à exaustão.

Até agora deu certo com os ministros da corte que inverteram o ônus da prova em desfavor dos réus; aplicaram ao processo penal conceitos previstos pelo processo civil; violaram direitos constitucionais como o da presunção de inocência (in dubio pro re ); puniram duas vezes um mesmo fato; flexibilizaram o uso de provas indiciárias; condenaram apenas pela suposição de que, ocupando cargos elevados na república, os réus deveriam ter conhecimento dos fatos ou, na melhor das hipóteses se omitiram.

Ora, são esses homens e mulheres, ministros e ministras da corte suprema, os encarregados de definirem o que é constitucional e o que não é. Se agem dessa forma equivocada, estamos perdidos. Daí o medo da reedição do golpe de 64. Naquela ocasião a mídia se aliou aos militares influenciando a opinião do povo, e deu no que deu. Hoje se une ao judiciário com o mesmo propósito. Haverá sucesso desta vez? Os ministros (não seriam juízes?) do Supremo, podem tudo? Não existe uma Corte Internacional de Direitos Humanos a ser consultada?

De minha parte não acredito, e torço para que isso não aconteça. Mesmo porque hoje, diferente dos anos 60, o povo está vivendo melhor. Tem emprego, melhorou seu poder de consumo, sente elevada a sua auto estima e respeitada, mesmo que parcialmente, a sua cidadania. Além do que, não existe mais o “perigo” do comunismo - está mais que provado que este é um sistema muito mais digno do que o capitalismo.

Resta à mídia servil, à burguesia empedernida e aos oligárquicos tentar envolver Lula nesse imbróglio. O STF já deixou claro que julga por presunção e não através de provas. Assim, por Lula ter ocupado o mais alto cargo da República, deve ter tido conhecimento e participado do processo em pauta, seguindo o raciocínio atual dos ministros do STF. Conseguindo isso, seria um pulo até alcançar Dilma.

Cortes Supremas de outros países, como Honduras e Paraguai, obtiveram êxito nessa conduta nebulosa e inconstitucional. Bem verdade que as populações daqueles países são menos politizadas que, hoje, a nossa. Mesmo assim, é bom colocarmos as barbas de molho.  

O presidente Lula criou cobras para picá-lo. Foi ele quem nomeou a maioria dos ministros do Supremo e quem escolheu o famigerado Roberto Gurgel , Procurador- Geral da República, a partir de uma lista tríplice. Não que esses senhores e senhoras devam ao Lula alguma reciprocidade no trato, mas também não poderiam esquecer a conduta moral e ética do ex-presidente que, em seus mandatos, mostrou respeitar a liturgia do cargo que ocupava. Ao contrário de alguns ministros do STF,  e do próprio Procurador Geral, que demonstram não conhecer a liturgia dos cargos que ocupam, os quais  prevêm isenção, responsabilidade, postura ético-social e respeito incondicional aos preceitos da Constituição da República e aos ditames da lei.


* Jeferson Malaguti Soares é Secretário de Comunicação no diretório municipal do PCdoB em Ribeirão das Neves/MG e colaborador deste blog.

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