Sexo frágil?

Por Cléber Sérgio de Seixas

“Dizem que a mulher é sexo frágil, mas que mentira absurda”, cantou Erasmo Carlos nos idos de 80. Os versos de Erasmo se tornam mais verdadeiros quando me vem à lembrança o exemplo de minha mãe. Mulher batalhadora, foi obrigada a tomar a dianteira do cuidado familiar desde que meu pai perdeu-se na vida mergulhando no alcoolismo. Com muita dificuldade, cuidou de três filhos e nunca deixou de trabalhar em virtude dos afazeres domésticos. No caso de minha família, por uma questão de sobrevivência, o patriarcado cedeu lugar ao matriarcado.

De fato, os que afirmam que o sexo feminino é frágil mentem, estão mal intencionados ou, no mínimo, mal informados. Embutido no dogma da fragilidade feminina esconde-se a intenção de sujeitar as mulheres a papéis secundários e subalternos na sociedade, sempre submissas aos representantes do sexo oposto.

O cristianismo cooperou para difundir o mito da fraqueza das mulheres. Isso explica porque as mesmas não exercem o sacerdócio no catolicismo, e porque poucas são as igrejas protestantes que admitem o ofício feminino.

Não são poucos os que consideram a mulher um ser humano de segunda categoria. Na última eleição presidencial, não faltaram aqueles que consideraram Dilma Rousseff despreparada para o cargo pelo simples fato de ser mulher. Assim, simbolicamente, a eleição de Dilma é uma vitória para todas as mulheres, na medida em que representa uma quebra de paradigmas no universo feminino.

Infelizmente, o machismo ainda sobrevive nos corações e mentes, não só de homens, mas também de mulheres, sendo que o machismo feminino costuma se revelar mais cruel. Ainda hoje, há aquelas que acreditam, tal como alguns homens, que lugar de mulher é em casa, cuidando dos filhos, esquentando a barriga à beira do fogão e esfriando-a à beira da pia.

O discurso da fragilidade feminina, sobretudo nos dias atuais, não soa tão verossímil, pois no pós-revolução sexual (se é que a revolução sexual um dia acabará) a mulher vem gradativamente conquistando espaços na sociedade. Hoje, desempenham praticamente as mesmas funções que os homens, salvo aquelas em que a constituição física faz-se relevante. No entanto, ao desempenhar as mesmas funções que os homens, as mulheres são menos remuneradas. No mercado de trabalho ainda são preteridas quando se trata de cargos de alto escalão. As poucas que chegam ao topo são alvo de olhares enviesados ou são flagrantemente estigmatizadas.

Mas isso é o mínimo a que as mulheres estão sujeitas. Da violência doméstica, passando pela superexposição na mídia como objetos de consumo, à criminalização do aborto, são vítimas constantes de abusos. Recentemente, o país ficou chocado com um vídeo no qual uma escrivã paulistana suspeita de corrupção foi forçadamente despida por e diante de vários policiais do sexo masculino.

A pesquisa Mulheres brasileiras nos espaços público e privado 2010, realizada pela Fundação Perseu Abramo (clique aqui para ler), apontou que duas em cada cinco mulheres já teriam sofrido algum tipo de violência, ao menos uma vez na vida, sobretudo algum tipo de controle ou cerceamento, alguma violência psíquica ou verbal, ou alguma ameaça ou violência física propriamente dita. A mesma pesquisa assinala que na maior parte das vezes a motivação para violências de gênero relaciona-se ao controle da fidelidade conjugal.

Diante dos abusos, as mulheres precisam do fortalecimento de legislações que lhes protejam da violência masculina. A Lei Maria da Penha consiste num grande avanço. Contudo, um dos calcanhares de Aquiles de tal lei está em sua aplicação. Como garantir, por exemplo, que o ex-companheiro vai manter-se x metros distante da mulher a quem maltratou? As forças públicas de segurança vão dispor de homens em número suficiente para garantir que tal restrição se cumpra?

Deve ser celebrado o processo emancipatório feminino ora em curso, mas é preciso reconhecer que muito ainda é necessário para que as mulheres, de fato, sejam libertas do jugo opressor a que estão submetidas. Deixar tal libertação a cargo de legislação específica é temerário. O engajamento de todas as mulheres e de todas as entidades relacionadas aos direitos da mulher faz-se, então, premente.

Para finalizar, assistam ao trailler do documentário O Silêncio das Inocentes.



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