O ANIVERSARIANTE ESQUECIDO


Por Cléber Sérgio de Seixas

A ceia está pronta. Comensais ávidos para degustar as apetitosas iguarias põem-se a postos depois de terem trocado presentes e votos de felicidade. O ambiente é todo enfeitado com luzes piscantes, e uma árvore decorada com bolas coloridas, presentes e pequenos adereços domina o centro da sala. Entretanto, mais sobressai o sorridente homem com a fantasia vermelha arrastando seu enorme saco cheio de presentes. Este homem encarna a alegria das crianças, e não se cansa de repetir o irritante mantra: “ho, ho, ho”. Em segundo plano vê-se um presépio em miniatura – adereço ofuscado diante da presença do homem de vermelho.

Esta cena poderia ter como palco qualquer residência se for constatado que a comemoração do Natal se repete no 25 de dezembro em praticamente todo os lares cristãos mundo afora. No entanto, o que poucos lembram é que tal comemoração é na verdade uma grande festa de aniversário, onde o aniversariante é ninguém menos que o próprio filho de Deus, cujo nascimento, segundo a tradição cristã, visou iniciar um processo que salvaria o homem e redimi-lo-ia de seus pecados.

Este nascimento se deu de forma humilde, não como os judeus esperavam, pois esperavam-no como um rei. O pobre menino nasceu numa manjedoura, espécie de coxo onde animais comiam, local inapropriado para um rei vir ao mundo. Daí o motivo dos descendentes de Abraão ainda esperarem seu Messias, seu salvador, já que um rei dos judeus não seria concebido em meio a tanta penúria. O fausto dos festejos natalinos, portanto, contrasta com a pobreza que cercou o nascimento do menino Jesus.

Em que data isto ocorreu? A tradição responde que foi no 25 de dezembro, mas tal datação não resiste a nenhuma análise bíblica, muito menos histórica. De qualquer forma, vamos fazer de conta que Jesus Cristo tenha realmente nascido neste dia. Se o 25 de dezembro marca seu nascimento, na categoria de aniversariante não deveria ser ele o mais lembrado neste dia? Alguém se lembra de ter ido a uma celebração de aniversário e ter presenciado algum convidado ilustre receber mais honrarias que o aniversariante?

Se observarmos o enfoque comercial, constataremos que o velhinho de barba branca e roupas de esquimó, o convidado ilustre citado anteriormente, aparece diante de nossos olhos nessa época mais que o filho de Javé. Mas de onde vem esse célebre homem? Da tórrida Palestina? Com tais roupas, dificilmente teria vindo de lá. Teria sido algum conterrâneo de Cristo?

Não é objetivo deste artigo aprofundar nas origens desse notório personagem. No entanto, sabemos que ele cresceu, deixou de ser aquele gnomo de roupas verdes e se tornou o velhinho rechonchudo que aterrisou com seu trenó nos terrenos da Coca-Cola para incrementar as vendas. Tornou-se um ilustre mascote que se divertia com as crianças - alvo principal do seu marketing - e, terminadas as travessuras, se refrescava com uma garrafa do conhecido refrigerante. Entre um e outro comercial da Coca, o bom velhinho ganhou até cachê como garoto propaganda de uma certa marca de cigarros.

Vejam as cores de sua roupa! Não são as mesmas da poderosa multinacional do refrigerante? Quão bem recebido foi pelas pessoas! Grande jogada publicitária! E os presentes que “ele” doa a todos? Que achado para os comerciantes! No Natal de Papai Noel, Deus e Mamon se reconciliam. O fim de ano aquece as vendas, tendo como carro abre-alas um fantástico trenó.

Portanto, nesse como em outros Natais, Papai Noel surge apoteoticamente nos lares após ter singrado o céu a bordo de sua espetacular carruagem puxada por renas, e ter descido pela chaminé. Enquanto isso, Jesus, outrora protagonista, hoje mero coadjuvante, entra despercebido pela porta dos fundos.

Comentários