IRÃ - DE KHOMEINI A AHMADINEJAD

"Na democracia islâmica, as leis não dependem da vontade do povo, mas do Corão e da Tradição do Profeta. O governo islâmico é o governo do direito divino e suas leis não podem ser mudadas".
Ruhollah Khomeini

Por Cléber Sérgio de Seixas


Mal o mundo islâmico terminou de lembrar os 20 anos da morte do aiatolá Khomeini, o Irã está prestes a reeleger Mahmud Ahmadinejad como presidente. O Irã é hoje uma das nações que compõem a lista negra de Washington, principalmente por estar levando a cabo um programa nuclear que os americanos teimam em dizer que não tem fins pacíficos. Para entender o complicado jogo de forças em ação hoje no oriente médio, bem como o fundamentalismo islâmico, é necessário voltarmos 30 anos no tempo de encontro a uma de suas origens: a revolução islâmica do Irã.

Desde 1953 o Irã era governado por uma monarquia, cujo líder máximo era o xá Rheza Pahlevi, governante títere dos interesses dos Estados Unidos. Nos anos 60 o xá decide por em prática uma série de reformas modernizantes, popularmente conhecida como Revolução Branca. Dentre as medidas incluia-se uma reforma agrária na qual as terras que há séculos pertenciam ao clero xiita foram redistribuídas. A partir de então os choques entre a monarquia e os religiosos tornaram-se constantes. Em meio a tal processo, o aiatolá Ruhollah Khomeini se torna um expoente da oposição ao regime. O exílio de 15 anos lhe confere a aura de mártir e, a partir de então, passa a comandar à distância a revolução. O xá governou o país com mão de ferro durante 37 anos. No final de 1978 os protestos populares contra a monarquia se acirraram e Pahlevi é obrigado a deixar o país. Acredita-se que mais de 90% da população teria apoiado a revolução.

Khomeini era considerado um intermediário entre Deus e os homens. Sua volta foi comemorada com festa por milhares de fiéis. No governo, ele centralizou o poder nas mãos do clero muçulmano e impôs o modo de vida islâmico a todo o povo iraniano. Bebidas alcoólicas foram proibidas, homens e mulheres foram separados em escolas e locais públicos; as mulheres foram obrigadas a se cobrir com o chador; a música foi banida do rádio e da TV.

Khomeini atribuía os problemas do mundo aos Estados Unidos e ao comunismo, a quem costumava chamar de Grande Satã. Em novembro de 1979, quando os EUA receberam o xá para tratamento médico, estudantes ocuparam a embaixada dos EUA em Teerã e fizeram 52 reféns. Os sequestradores exigiam a extradição do ex-monarca, que àquela altura já havia sido proscrito e condenado à morte pelo aiatolá. Houve uma tentativa de resgate que fracassou. A libertação dos reféns só ocorreria em 21 de janeiro de 1981, quando terminou o governo do democrata Jimi Carter, num processo de negociação de reféns, de condições até hoje obscuras, que teria contribuído para a vitória do republicano Ronald Reagan nas eleições americanas.

A revolução iraniana teve profundas repercussões no oriente médio, fazendo com que nos anos seguintes o extremismo xiita se convertesse em motivo de sérias preocupações para o mundo ocidental. A ideário da revolução dos aiatolás inspiraria várias organizações políticas mundo afora, grande parte delas valendo-se de táticas terroristas.

Para tentar barrar a influência da revolução islâmica do Irã, bem como resguardar seus interesses na região, os EUA financiam o ditador do Iraque, Sadam Hussein. O atrito entre os dois países transformou-se numa sangrenta guerra de 10 anos.

Também preocupada com os impactos do potencial revolucionário do fundamentalismo islâmico de inspiração iraniana, a URSS decide, em 1979, ultrapassar a fronteira russo-afegã para aliar-se ao regime colaboracionista de Cabul. O resultado, no entanto, não foi o esperado, já que a presença soviética incitou a rebelião das tribos afegãs, que se uniram contra o inimigo comum externo. Dentre os combatentes, estava um jovem guerrilheiro chamado Osama Bin Laden. Nove anos e 15 mil mortos depois, os russos resolvem deixar o Afeganistão que, doravante, passaria também a ser uma nação teocrática, sob o poder do Talebãs.

Com base nessa pequena explanação podemos obter algum entendimento sobre as situação de países como Afeganistão, Iraque, Paquistão e, obviamente, Irã, bem como de organizações terroristas como a Al Qaeda. Para o bem ou para o mal, o fato é que a Revolução Iraniana de 1979 foi uma autêntica revolução popular, levada a cabo num tempo em que os analistas políticos já não acreditavam ser possível o assalto popular ao poder, já que as modalidas dominantes de transformações políticas eram as ações militares, as intervenções estrangeiras e toda sorte de soluções de acomodação.

Portanto, podemos dizer que Bin Laden é herdeiro da revolução iraniana e que o fundamentalismo islâmico é tributário da revolução dos aiatolás.

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